Aos que vivem da vida alheia

Aos que vivem a vida alheia

By Franklin Maciel


Não!

Não me venham falar mal das coisas,

Ou das gentes, ou do raio que o parta!

Pro inferno vocês todos!!!

Esguichem o veneno de suas línguas numa taça podre e enfeitada

E bebam enquanto masturbam suas invejas!

Não quero saber quem, ou que, ou tanto faz!

Que me importa se as coisas ou pessoas, ou o tempo, ou o governo, ou as estrelas e entrelinhas do céu ou de um inferno qualquer não prestem!?

A imprestabilidade das coisas e pessoas e tudo

Reserva em si, mais beleza que todas as coisas ditas úteis

A utilidade das coisas tem sempre um fim, um endereço certo,

Conhecidamente, certo,

E eu prezo o infinito...


Não quero amar o Sol porque me aquece

Ou ilumina,

Ou desencadeia uma série de coisas no mundo

Não, não quero essas funções em tudo!!!

Antes amá-lo por ser Sol somente

Semente num universo de sementes que germina em outras sementes

Que farão seu ciclo de vida e morte até tornarem-se estrelas

Que são tão sementes quanto tudo que há

Sempre, aguardando um novo florescer, um novo despertar,

Um novo desafio

Num infindo movimento de incertezas


Quero uivar como lobos em frente as catedrais

E mijar ao pé do busto de um herói municipal

Que fica bem ao centro da praça central

Enquanto a bandinha toca no coreto marchinhas de carnaval


Quero beijar as faces rosadas da rotunda filha feia do prefeito

E apertar as nádegas carnudas das damas da sociedade

Não por ser uma, a filha do prefeito,

Ou outras, socialites, ou, quem sabe, putas ou filhas da puta

Mas por serem em si,

Essencialmente,

Mulheres

Pórtico entre Deus e o pecado

E o pecado mora ao lado...

Ou dentro de mim... De nós

Que diferença faz?


Antes de ver o mal que as coisas encerram

Prefiro sentir a poesia que delas inicia

Ver no veneno um passaporte para a liberdade

Experimentar o gozo onírico dos suicidas

Vasculhar a poesia dos assassinos

e seu fascínio pela morte

Na morte, vislumbrar um recomeço,

a possibilidade divina por trás das névoas espessas que separam meus olhos

da realidade de tudo


Poder germinar o amor reprimido e não correspondido

No coração dos invejosos de dardejantes olhos


Ter o meu corpo leve e nu

Pra me perder no vento sem destino certo

Como o dente-de-leão


Acreditar nas coisas impossíveis

Beber a água dos rios

Cometer ultrajes, talvez infâmias!

Sem que o remorso me roa os ossos


Trocar os talheres pelas mãos

A fim de sentir a magia fluir da alma de cada alimento


Usar maquiagem pesada no rosto

Sem que me chamem de bicha

Ou melhor,

Não me preocupar ou aborrecer, se chamarem louco

Roto, bicha ou qualquer outro absurdo

Eles/elas nada sabem de mim

E, se o soubessem, o que haveriam?


Talvez não mais que um espelho refletindo eles/elas mesmos

Ou uma criança enrolando nos dedos, os cabelos


E, ao chegar a avançada idade

Que eu não leia nas minhas rugas e cabelos brancos (se ainda houver cabelos)

Os retratos de uma amarga existência

Mas, o substrato de algo que viveu/ vive deixando viver

Como um gato que mia no telhado

Alheio às pedras e botinas


Portanto, meus amigos

Não me encham com suas reclamações

E seu gosto frio pela vida

Corram nus pelas escadas rolantes dos shoppings centers

Comendo algodão doce cor-de-rosa

Que roubaram da titia

Fazendo, do eterno amanhã

O hoje imediato de suas vidas


06/09/02

"In Portraits, 2004- PHD Grafics"







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