Primeiro gole de álcool agora é aos 13

Fonte: Diário do Grande ABC/SP
26/08/07


Coordenador da pesquisa, o psiquiatra Ronaldo Laranjeira diz que, num país onde quem regula o mercado do álcool é o próprio mercado

Os jovens de hoje começam a beber cada vez mais cedo. Adolescentes de 14 a 17 anos de todo o País experimentam bebidas alcoólicas pela primeira vez, em média, aos 13,9 anos. Entre pessoas de 18 a 24, a idade aproximada do primeiro gole está na faixa dos 15,3 anos.

Os dados são do 1º Levantamento Nacional Sobre os Padrões de Consumo de Álcool na População Brasileira, da Senad (Secretaria Nacional Antidrogas) em parceria com a Unifesp (Universidade Federal de São Paulo). O estudo só confirma o que, na prática, era visto por quem atua na área.

Coordenador da pesquisa, o psiquiatra Ronaldo Laranjeira diz que, num país onde quem regula o mercado do álcool é o próprio mercado, o resultado não poderia ser diferente. "O Brasil é um dos únicos países onde o consumo de álcool cresce de 8% a 10% ao ano", afirma.

A cerveja é a principal bebida na preferência dos brasileiros, sejam eles maiores ou menores de 18 anos. Entre os adolescentes, é a mais pedida entre 52%. O vinho, com 35%, e os destilados, com 7%, vêm em seguida.

As bebidas ice, de teor alcoólico parecido com a cerveja, mas muito mais doces, representam 6% das doses tomadas pelos jovens. "Esse tipo de produto é a porta de entrada de muitos", explica Laranjeira.

ICE - Daniela (nome fictício), 17 anos, está entre os bebedores das ice. A estréia da moça de Santo André foi aos 12 anos, com uma bebida chamada Duelo, doce, de alto teor alcoólico e sabor de frutas. "Acabei em coma alcoólico." Agora, experiente, garante que aprendeu a se controlar. Um colega dela de 17 anos até bebe cerveja, mas prefere conhaque.

A overdose de publicidade, voltada exclusivamente ao jovem, é um dos fatores que resulta no fato de 16% dos jovens beberem excessivamente, diz Laranjeira. Isso significa que eles tomaram, em curto espaço de tempo, cinco doses (para os rapazes) e quatro (para as mulheres).

A bebedeira é responsável por aumentar as chances de se fazer alguma besteira, explica a coordenadora de prevenção da Senad, Doralice Oliveira Gomes. "Em estado de embriaguez, estão mais suscetíveis a transarem sem camisinha ou se envolverem em alguma briga."

A maior surpresa do estudo, conta Doralice, foi positiva. "A maioria dos jovens é abstemia: 66%", comemora.
O desafio, agora, é criar políticas públicas que consigam mantê-los longe do copo.

"Não temos gostosonas para convencer os jovens"

Diadema se propôs a realizar uma longa e difícil tarefa: visitar cada um dos bares da cidade e convencer os proprietários a não venderem bebidas a menores de 18 anos.

"São 4.800 bares. É um trabalho de formiguinha. Porque, na TV, aparece logo depois uma mulher toda gostosona bebendo cerveja. Não temos uma dessa para percorrer os bares falando o contrário", diz a secretária de Defesa Social de Diadema, Regina Miki, que implantou na cidade a lei seca, em que os bares têm de fechar até as 23h.

O nome do projeto é Juventude Viva. A visita aos bares é feita por uma equipe pequena, de um adulto e dois adolescentes. "Os próprios jovens, quando vão até os locais, têm maior poder de convencimento" , acredita Regina Miki.

E haja lábia: levantamento da Prefeitura feito em 460 bares revela que 82,4% venderam bebidas para adolescentes. Isso, pontua a secretária, mesmo sabendo que se tratavam de menores de idade, que era para consumo próprio e de que estavam descumprindo a lei.

Para mudar a mentalidade de que só é possível se divertir bebendo, a cidade também promove ações culturais, como o Noitão, que vira a madrugada com peças de teatros.

Coquetel

Para matar a vontade dos jovens, o bar e restaurante Empório Santa Vitória, no Centro de Diadema, criou vários coquetéis sem álcool. "A idéia é diminuir a ansiedade do adolescente, que quer participar do mundo dos adultos", explica Camilo Pirovani Kempinas, um dos proprietários do estabelecimento.
O próximo passo é a criação de uma domingueira, com DJ e programação especial para os jovens. Claro, tudo regado a bebidas sem álcool.

Enquanto ricos tomam duas doses, pobres bebem cinco

Pobres bebem mais do que os ricos, revela o levantamento da Senad e da Unifesp. Quase dois terços dos brasileiros da classe A bebem geralmente até duas doses, enquanto aproximadamente metade dos de classe E consome cinco doses.

Entre as regiões do País, a diferença está entre freqüência e quantidades. Nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, a população bebe mais doses, principalmente, de destilados. No Sul e Sudeste, o consumo de álcool é mais freqüente.

O estudo, segundo o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, servirá para direcionar as políticas públicas de combate ao uso exagerado do álcool. "(A pesquisa) ..vai refinar e direcionar as políticas e as ações do ministério nessa área porque sabemos onde está o problema e como vamos reverter essa situação", disse o ministro, por meio de nota.

Exagerados

A pesquisa revela também que um em cada três brasileiros bebeu exageradamente alguma vez no último ano. Mais da metade dos que bebem demais o fazem uma vez por semana.
Os homens são a maioria entre os consumidores de álcool. A abstinência entre as mulheres é de 59%. Entre eles, de 39%. No total, o número de abstêmios é grande. Quase metade dos brasileiros (48%) não bebe ou o faz de maneira insignificante.

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