Tábua Rasa
* Franklin Maciel

Um fator pouco discutido e admitido (talvez por uma certa arrogância do meio intelectual ou talvez porque o teoricismo não lhes permita sair detrás da escrivaninha e conhecer o mundo real empiricamente) é o crescente nível de politização das classes menos favorecidas, em detrimento de uma mediocrização crescente da classe média para as questões elementares do país, atadas à valores e conceitos conservadores e atrasados que não lhes permite a flexibilidade mínima necessária para entender os desafios sócio-econômico-culturais deste princípio de milênio, em que o sistema capitalista-liberal chega à seu ápice e conseqüente colapso, iniciando um movimento autofágico inevitável, em função da excessiva concentração de renda e poder e conseqüente diminuição de mercados consumidores pela não distribuição de renda, ou seja, produz-se cada vez mais com menos mão-de-obra, e, menos mão-de-obra, é menos pessoas pra consumir e menos pessoas para consumir, não há para quem vender. Uma prova cabal disso é que, atualmente, salvo exceções, só têm mantido taxas de crescimento, setores que conseguiram manter um certo monopólio dentro da atividade e a quebra acentuada dos pequenos varejistas; Muita oferta pra pouca procura.
Menos escolarizada que a classe média, com menos acesso aos bens e serviços de uma sociedade moderna, aos quais é exposta vorazmente através dos meios de comunicação de massa, preterida historicamente nos processos sociais e econômicos, não tendo dinheiro para pagar um plano de saúde, escola particular, atividades de lazer, as classes mais baixas se viram obrigadas à aprender os caminhos e mecanismos legais e públicos afim de garantir o mínimo de qualidade de vida à si, à sua família e comunidade. Cônscias de seus direitos básicos por força da necessidade, essas camadas da sociedade acabaram por descobrir os meios práticos e não teóricos do funcionamento político e social e agora começam à cobrar a fatura.
Na outra ponta, a classe média, acostumada à ter seus direitos básicos atendidos, como saneamento básico, moradia, alimentação, acomodou-se numa zona de conforto que a distanciou da realidade social, eclipsando-a no individualismo, no “resolver o meu lado”, desinteressando-se qualquer interesse senão o interesse pessoal, o q a fragilizou politicamente em conceitos rasteiros e maniqueístas do tipo: “É porque é!”.
Talvez o preço do arroz, do feijão da cesta básica, do cimento, acesso à cidadania à TODOS, por não estarem dentro das listas de prioridades da classe média, afinal dela sempre prescindiram, pareçam desimportantes à classe média, assim como o acesso de classes sociais mais baixas à universidades incomodem pois coloca num mercado cada vez mais visceral e com menos oportunidades, novos competidores muito mais afoitos à conquistas, pois delas foram notoriamente privados durante a vida, porém, é importante, mais do que nunca, mobilizar toda a sociedade sobre alternativas reais e consistentes para o enfrentamento da nova realidade que se apresenta que é o de construir uma sociedade mais plural onde Todos, sem exceção, tenham preservadas suas condições de dignidade e qualidade de vida. O crescimento econômico puro e simples, como é aventado, não é sustentável no que tange à distribuição de renda através da geração de empregos, pois, como sabemos, cada vez se ganha mais com menos, portanto, urge a presença de Estados mais atuantes e presentes, regulando as cadeias produtivas, evitando o esgotamento de recursos naturais, reordenando o sistema trabalhista, distribuindo melhor a renda, senão, não vai adiantar se esconder dentro dos condomínios fechados ou dos PCCs da vida, como senhores da Idade Média, pois a história já nos demonstrou que, uma sociedade injusta, onde a maioria é acuada, reage derrubando e saqueando tudo que encontra pela frente.
É hora de abdicar um pouco do conforto e iniciar a partilha, ou não vai sobrar muita coisa pra dividir.

Comentários

Anónimo disse…
Franklin: muito bom!!! É por aí que caminho os humanos brasileiros...
Anónimo disse…
é por aí que caminha os humanos brasileiros...