O Distrito 9 é aqui !

O Distrito 9 é aqui !


O filme Distrito 9 que acaba de estrear com certo atraso nos nossos cinemas, é uma metáfora clara das políticas habitacionais e sociais dos governos neoliberais pelo mundo, principalmente aqui no Estado de São Paulo e seu filhote mais querido São José dos Campos.


No filme, aliens chegam à Terra e sua nave, de maneira misteriosa fica parada sobre o céu de Joanesburgo , na África do Sul, coincidentemente o laboratório mundial, onde a elite branca experimentou tornar explícito o apartheid social que todos vivemos no dia a dia de forma velada para verificar o desenrolar de tal empreendimento que, caso houvesse obtido o sucesso esperado, provavelmente teríamos esta realidade nua e crua esparramada por todo o globo de forma escancarada.


Como nada acontece, os humanos arranjam um jeito de entrar na nave e, ao entrar, encontram um mulitdão de aliens à beira da morte, em péssimo estado de saúde.


Assim, trazem-nos à Terra e os mantém em Distritos (o Distrito 9 do filme) uma espécie de gueto de Varsóvia para Ets. Neste gueto, sob as péssimas condições sociais em que se encontram, estes aliens começam a formar favelas como as que temos esparramadas por todo o país, assim como, devido à exclusão social gritante, que os separa dos humanos, começam à cometer delitos típicos da exclusão, como pequenos furtos, tráfico de drogas (no caso ração para gato) prostituição entre outros. Assim, passados 20 anos, a população local de humanos, começa a pressionar o governo a dar um jeito de se livrar dos aliens , dos “indesejáveis” que estão “incomodando a paisagem” social, arranjando um jeito de tirá-los de perto dos centros e realocá-los num vazio demográfico distante da cidade.


Quem acompanhou o desastroso projeto habitacional de São José dos Campos no governo Emanuel Fernandes que culminou na criação do conjunto São José 2, onde famílias que viviam em favelas próximas ao centro da cidade e à bairros centrais foram todas realocadas num vazio demográfico (O Bairro criado para receber toda essa gente até hoje, não possui ligação fronteiriça com nenhum outro bairro, caracterizando de forma cruel a segregação imposta) , tendo desmanchados todos os seus vínculos sociais, seus meios de subsistência (grande parte desses cidadãos viviam de pequenos bicos e da reciclagem de lixo, impossível de ocorrer no isolamento e na distância da cidade onde se encontram, visto que, longe da população que consome, não existe lixo para se recolher e vender à reciclagem, nem pequenos trabalhos, os bicos), “empurrados” para os limites da cidade (O São José 2 fica na divisa com o município vizinho Caçapava), muitos deles acabaram recorrendo a violência e ao tráfico de drogas para manter condições mínimas de sobrevivência, assim como ocorreu com os alienígenas do filme (A coisa aqui foi tão séria, que houve um tempo onde o bairro tinha toque de recolher e o tráfico de drogas controlava quem entrava e saia do bairro, não permitindo que agentes do poder público, lá entrassem como foi amplamente divulgado pela mídia local).


Esse processo, sempre ocorrido de forma truculenta, valendo-se da imposição pela força e de instrumentos legais de intimidação, com a utilização de intensa propaganda oficial afim de manipular a opinião pública em favor dessas desocupações (que continuam ocorrendo, basta ver o caso da Vila Leila, onde as pessoas foram obrigadas a mudar de suas casas para que fosse contruída uma grande via, a Via Norte), assim como no filme, sempre oculta interesses comerciais. (No filme, a MNU, espécie de ONU quer utilizar esse processo para se apropriar de tecnologia alien na indústria de armas; aqui entre outros casos, auxiliou-se o mercado imobiliário, comércio (uma das favelas foi retirada como condição para a instalação de um grande hipermercado, que recebeu inclusive, grandes investimentos de infraestrutura ao redor, resolvendo um problema de enchentes que perdurava por quase 30 anos e que sacrificou toda a população).


O caso da ocupação do Pinheirinho na zona Sul de São José é outro exemplo, onde essa idéia do Distrito 9 se encaixa perfeitamente, inclusive com o aparato oficial usando a miséria e a criminalidade oriunda da mesma para jogar a opinião pública contra os sem teto.


Por uma dessas ironias do destino, o termo criado pelo então prefeito Emanuel Fernandes para desqualificar as lideranças desses movimentos sociais é Chupa Pobres, uma corruptela do caso do ET de Varginha que ficou conhecido como Chupa Cabras, ou seja, as pessoas em situação de vulnerabilidade social desta cidade já são Ets há muito tempo para o poder público.


Parabéns ao diretor Blomkamp e ao produtor Peter Jackson pela coragem de trazer um tema tão importante e tão presente aos nossos dias através do cinema.


Que mais filmes como este sejam produzidos permitindo a todos um novo olhar sobre a maneira brutal e desumana como temos conduzido nossa sociedade.


Fica claro no filme que, mesmo a mais avançada civilização, em situações de dificuldade extrema acaba tendo de recorrer a violência e a instintos primários para sobreviver. Estamos à beira de uma guerra civil aberta, cabe a nós escolher o final deste filme.



Franklin Maciel


Comentários

Anónimo disse…
Sua crítica assim como qualquer crítica produzida antes, é fruto de sua subjetividade enquanto testemunha do que ocorre...A subjetividade há que ser sempre manifestada, entretanto, é necessário muito cuidado, uma vez que a subjetividade pode dar margem a parcialidade e no séc XXI não há mais espaço para os parciais. Veja os 2 lados e perceberá assim como Orwell(1984) que o único sistema de governo eficaz que já existiu foi o idealizado por Platão em A República. Quanto ao filme, que assisti há algum tempo, creio que tenha sido mais uma tentativa de intertexto (até de mesmo foco) c/o filme:Inimigo Meu e c/o livro Metamorfose(Kafka)do que propriamente dito c/as fraudulentas eleições Norte-amercianas de 2000. Arte mais universal,cuja metáfora é chocantemente real:meu melhor e maior inimigo é meu semelhante, este que por incrível que pareça é da mesma espécie que eu. The more you learn the less you believe. Michael Moore também crítica, mas atinge mais gente devido a ferramenta que utiliza para isso. Pense nisso... constrói!