Uma cultural que inclua

Acho importante essa discussão suscitada pelo artigo do Adriano Pereira sobre uma atuação do movimento cultural mais politizada e comprometida com a sociedade como um todo.

Vivemos uma realidade no país onde há uma crise de alteridade muito grande, daquela onde "os culpados são os outros" onde " o povo não sabe votar" enfim, nós, como seres superiores, muito além do vulgo comum que rotulamos sob o título genérico de povo, sempre somos diferentes, especiais, tomaríamos outras decisões, entretanto, quando o discurso fácil e de senso comum cai, o que fica na fria realidade dos fatos, na maioria das vezes é uma superficialidade rasa que não consegue estender o olhar para além das fronteiras do próprio umbigo.

Infelizmente, artistas em sua maioria, costumam ser auto-indulgentes demais. Descolados e desengajados da sociedade, preferem a comodidade do guarda-chuva da incompreensão, do gênio muito à frente de seu tempo, como se todos, em sua incapacidade em transmitir suas "idéias geniais" à sociedade inculta e alienada, fossem novos Van Goghs, quando infelizmente, a imensa maioria é tão alienada, mesquinha e desengajada como qualquer cidadão comum.

Não estive neste encontro específico, mas já conferi de perto dezenas de outros, onde o sentimento que impera é o da auto-vitimização, da ausência de idéias e conceitos, da desorganização(que leva ao jargão da reunião pra decidir a data da próxima reunião) e da tendência de afunilar a discussão em se articular para coagir o poder público não à implantação de uma nova política cultural que abranja um novo modus operandi em todo a sociedade, mas simplesmente na tentativa obtusa de conquistar migalhas particulares, numa atitude claramente neoliberal de socializar as despesas e privatizar os lucros, nada diferente dessa realidade excludente onde o povo sempre paga a conta do prejuízo do setor privado.

Assim, se queremos de fato um cultura transformadora, que forme cidadãos e massa crítica e que dê oportunidades à todos em lutar para diminuir o imenso abismo social que nos separa, precisamos descer do tijolo, mudar o discurso e por mãos à obra.

Franklin Maciel
Dramaturgo, poeta e cientista social

Cartazes e filipetas
Adriano Pereira
Fonte: Jornal Valeparaibano
participar da primeira reunião entre atores e produtores de teatro do muncicípio com a Fundação Cultural Cassiano Ricardo.

Um encontro que deveria servir para discutir, finalmente, a criação de uma política cultural no município, acabou parecendo uma reunião de grêmio estudantil de ensino fundamental que pede desconto na cantina da escola, ou mais tempo de recreio.Parece que essa abertura de diálogo, uma marca que a nova gestão da FCCR quer implantar, pegou todo mundo num truque de cena.

Durante anos a classe artística cobra uma conversa, e quando ela acontece, ninguém tem quase nada de interessante para falar.Anos de insatisfação desde a criação da Fundação Cultural (talvez o último movimento cultural realmente organizado na cidade que tenha gerado algum fruto), em 1985, fizeram com que os convidados para o encontro despejassem desejos e vontades que formam um monte de bobagens juntas perto do que se propôs discutir.

No ano passado, um grupo formado por artistas da cidade, a maioria do teatro, criou o Fórum de Produtores de São José dos Campos. Na primeira reunião, que contava inclusive com a presença de Cláudio Mendel, atual diretor cultural da FCCR, falava-se aos quatro ventos sobre a falta de política cultural da Fundação. Pois bem, a noite de segunda-feira seria essa oportunidade, aquele encontro final entre "vilão" e "liga da justiça" que poderia acabar em morte do "maléfico", ou num "turn over" em que os dois se abraçam para salvar toda a humanidade.

Mas a "liga da justiça" não quer um "vilão", quer uma mãe cubana de sobrenome Castro. Este Fórum de Produtores discutiu durante todo o ano de 2008, e em nenhum momento pensou numa proposta que não fosse assistencialista. Tanto é assim, que durante a reunião não conseguiram apresentar mais do que uma única proposta interessante.

O que mais foi pedido durante o encontro foi a impressão de cartazes, filipetas, fotos e vídeos de divulgação, tudo subsdidiado pela Fundação. Pediram até carro para levar cenário, ajuda para montar figurino, cobraram pressa no processo de criação do Fundo de Cultura, querem prêmio de incentivo, enfim, só falta pedirem que o símbolo da FCCR deixe de ser o pavão e passe a ser uma foice e um martelo.

Essa classe teatral atual da cidade está presa ao modelo de gestão ineficiente que marcou a FCCR durante tantos anos. Como consequência disso, fica ela mesma ineficiente. Prenderam-se a um edital que cumpre apenas uma burocracia e não conseguem entender que lá agora está um deles, com boas ideias, e com a vivência que lhe dá respaldo para saber o que realmente é necessário. Pronto e autorizado a mudar as regras, se este for o caso.Apenas um participante conseguiu entender isso. Chegou a alertar durante o encontro, mas não foi ouvido como deveria ser. Se as reuniões fossem para resolver os problemas que sempre existiram na Fundação, seria necessário parar o mundo e começar de novo.

O dever dessa classe que compareceu ao encontro, e das próximas que virão da música, da literatura e da dança, é pensar em algo que dure mais do que um cartaz ou uma filipeta. Algo que fique como exemplo para outras administrações depois de 2010. Afinal, esse pavão que dá tudo é no fundo uma fria mãe adotiva, que vai embora no final de um mandato, deixa um grupo sem leite e passa a amamentar outro. Era para acabar com isso que o encontro foi marcado.

Adriano Pereira é jornalista em São José dos Campos

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