Manhã de Carnaval

Manhã de Carnaval
Franklin Maciel

Ruas vazias esquecidas de gente
de tráfego, correria, buzinas
Livres do mal humor que começa diante do espelho
entre escovadas e pensamentos,
da atmosfera neurótica, fumacenta e frenética
engolidas pela ressaca do feriado prolongado

Os tambores de até bem pouco
Dão lugar a um silêncio que já nem existia
Um silêncio que pouco a pouco vai tomando vida
Vida nas árvores, vida na brisa, vida de pássaros cantando...
De onde vieram?

Em que canto desta realidade de concreto
têm escondido seu canto?
Por onde vão suas asas nesses céus cinzentos
que esquecemos de notar pela pressa?

Mas ali estão eles nesta singela manhã de carnaval
feito um pequeno milagre

Nas ruas um bêbado que perdeu o compasso
Dribla as próprias pernas na calçada
como bailarino esquisito à procura de equilíbrio
cuja vitória é encontrar o caminho de casa

Noutra esquina, o trabalhador triste
Sentado à beira da floreira
aguarda o ônibus com a renúncia
de quem espera pela vida que passou pela janela

Sigo em frente, os sinais fechados não incomodam
antes convocam a olhar para os lados
E conhecer novamente a cidade
como uma casal há anos casado redescobrindo um ao outro
Tão diferentes e próximos,
tão desconhecidos em sua cumplicidade diária
Que um mero olhar reaviva um sabor d'amor de primeira vista

Policiais retiram um corpo de alguém que passou do ponto
no meio da via expressa.
Indiferentes à morte como um açougueiro de ofício à talhar a carne
Será que amou, foi amado, quem se importa?

E a manhã prossegue preguiçosa, pois é carnaval
Dia em que acordar não vale
Tempo pra sonhar colorido
Até a cinza a quarta-feira
Com sua insalubre realidade

Franklin Maciel

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