Pombas
Portadores de doenças e poluidoras, essas aves construíram reputação de beleza e virtude
Luis Fernando Verissimo

Uma vez pedi um "piccione arrosto" num restaurante em Assisi, na Itália,
e imaginei que aquele pombo podia muito bem
ser um descendente direto dos pássaros que conversavam com São Francisco.
Mastiguei-o com mais gosto.
Não sei o que as pombas diziam ao santo homem mas estou certo que o
enganavam.
Pombas são dissimuladas e de péssimo caráter.
Profissionais de relações públicas devem venerar as pombas,
pois são o maior exemplo conhecido do triunfo de RP sobre a realidade.
São animais lamentáveis, portadores de doenças e poluidores,
mas construíram uma reputação de beleza e virtude que resiste aos séculos.
Desde os tempos bíblicos. Foi uma pomba lançada por Noé da arca que trouxe o
ramo de oliveira,
provando que o dilúvio chegava ao fim.
Quando Noé a lançou de novo para guiar a arca para a terra seca ela,
calhordamente, sumiu,
mas essa parte da história é pouco lembrada pelos seus fãs.
Fartamente paparicadas e poupadas - a não ser por quem, sensatamente, as
pega,
cozinha e come com polenta - as pombas transformaram-
se em pragas urbanas.
Em lugares de muito turista elas andam no meio da multidão com uma empáfia
de sultão,
e acrescentam a arrogância a todas as suas outras antipatias
- sem falar no cocô que espalham por toda parte, inclusive nossa cabeça, em
escala industrial.
E no entanto são símbolos de pureza, símbolos de inocência e paz.
Tudo Relações Públicas.
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